quinta-feira, 7 de abril de 2016

O Dia do Silêncio

Vivemos numa civilização onde há excesso de barulhos, e por consequência, tivemos que aumentar o  tom de nossa própria voz de forma bastante considerável.  Este é um dos motivos que fazem sentido, pois quanto mais alto o barulho em volta, mais alto temos que falar. É claro que eu faço o contrário. Quer me ouvir, abaixe o rádio, a televisão... 

É claro que temos que levar em conta que falar alto pode ser um sintoma de ansiedade ou até de insegurança... sim, por medo de não serem ouvidas, muitas pessoas falam alto e rápido.

Existem outras razões também, certamente. Pessoas que falam desta forma e precisam sempre se cercar de pessoas, numa tentativa de "não solidão", que não se resolve e só potencializa o sintoma.

 Estas pessoas mesmo sozinhas,  ligam a televisão só para terem a sensação de companhia. Precisam de barulho. Lamentável, mas comum e verdadeiro. Uma versão mais saudável e terapêutica seria ouvir música. Ah... adivinha que tipo de música ela vai ouvir? Aposto que nada que acalme. Música light as deixa nervosas.

Isto ocorre com mais frequência do que gostaríamos. Em um dia comum, a pessoa pega um taxi, por exemplo. Ela entra e cumprimenta o motorista educadamente. Ele fala do engarrafamento, você responde monossilabicamente só pra não deixar o sujeito no vácuo. Ele percebe? Não. O rádio está falando alto em uma sessão tortura auditiva - contando todas as mazelas e coisas ruins que acontecem.

Ele comenta. Momento respirar fundo e dizer que não costuma ouvir esse tipo de noticiário para não ficar sob o efeito energético e não começar o dia triste. Como se nada tivesse ouvido, ele conta casos e dá opiniões sobre o governo, o desgoverno, fala da mulher e dos filhos. Pronto,  você está diante de um drama: avisa a ele quanto será a sua consulta, ou desce do taxi. Como você não quer ficar no meio do caminho, tampouco piorar um pouquinho o dia do sujeito, acaba falando com ele, mudando de assunto, tentando levantar o astral. Ok, quando você chega ao destino, já está cansada, pode voltar pra casa.

Enquanto isso, o tempo passa, você chega ao consultório do seu médico. Lá tem uma bendita televisão aos berros, ninguém vendo, pacientes totalmente sem paciência, falando pelos cotovelos, recepcionistas falando ao telefone em voz alta. Claro, tanto barulho, o tom de voz sobe automaticamente.

O paciente do lado, sem a menor cerimônia pergunta qual é o seu problema. Você educadamente diz que está bem. Ele se conformou? Coisa nenhuma! "O Dr. Fulano é ótimo, está tratando da minha..."  conta suas doenças e sofrimentos, apesar de você estar dentro da sala de espera com óculos de sol e fones de ouvido. As pessoas não sabem ler sinais óbvios.

Penso em me libertar e fazer um curso de grosseria. Nem isso daria certo, à essa altura estou dando conselhos, mandando a pessoa ter fé, ensinando um chazinho, indicando óleos essenciais,  indicando que faça meditação, e mandando orações pelo whatsapp. 

Saio da consulta de bom humor e acho que mereço almoçar em um lugar legal. Nada de ostentação, mas uma comidinha simpática. Chego no restaurante, que não tem televisão - me recuso a entrar em restaurantes com tv - sento, e eis que me entra um bando de senhorinhas simpáticas e alegres até demais para o meu gosto e ouvidos sensíveis - contavam a saga da escola onde dão aulas, pelo menos tentam dar. Falam o nome da escola, da diretora, de colegas, e de repente você ouve um nome e sobrenome. As pessoas estavam abrindo a sessão malhação de Judas. À essa altura, a minha vontade de ir embora transformou-se em outra e quando vi já estava diante da mesa das respeitáveis professoras.

Voz controlada, sorriso forçado, mas não aguentei e disse: "Me perdoem a intromissão, mas a Fulana é minha amiga de infância, minha vizinha, e se vocês a veem desta forma, se o caso é tão grave assim, pergunto a vocês, já falaram com ela a respeito, ou sorriem e conversam como se gostassem dela? Vocês são o quê mesmo? Educadoras? Que lamentável!"

A verdade é que não conhecia a pessoa em questão, mas fiquei indignada com a qualidade de seres humanos que está se instaurando e piorando vertiginosamente no mundo. Professoras mal educadas falando alto e mal das vida dos outros, sem contar o fato de citar nomes. Se falavam de alunos? Sim, falavam mal, claro!

Que fique bem claro que não estou falando da classe - eu sou professora também, mas se tiver que comentar sobre pessoas falo baixo e não cito nomes, pelo menos. rsrrs

Fiz isso e quase saí correndo do restaurante morrendo de medo daquele bando, sim... pela falta de educação e comportamento, era um bando e não um grupo de professoras. Chamei o garçom e disse que lamentava, mas precisava me retirar.

Agradeci a Deus que elas ficaram paralisadas me olhando enquanto eu saía às pressas morrendo de medo. Esse meu lado ariano é engraçado, faço as coisas num ímpeto e depois morro de medo das consequências. Ufa, deu tudo certo!

Outro táxi até chegar em casa e já entrei dizendo com voz mansa: "O senhor pode me levar em tal rua? Vou fechar os olhos um pouquinho porque estou cansada. Posso lhe pedir uma grande gentileza? Seria possível desligar o rádio? Estou com um pouco de dor de cabeça. bom trajeto para nós!"

O sujeito me falou para tomar cuidado porque poderia ser gripe ou dengue. Nesse momento eu nem precisei do curso de grosseria: "Senhor, eu gostaria de pensar um pouco em silêncio e lhe agradeço se não conversarmos". Me senti péssima, pois sei que não é só falta de noção, é solidão e carência.

Enfim, cheguei em casa e avisei: “estou bem, correu tudo certo, mas agora vocês só ouvirão minha voz amanhã. Preciso pensar.”

Ainda bem que a família me conhece e sabe que isto não é estranho, como dizem, “sou peculiar”.

Ainda bem, não estou nesse fluxo de não pensar, não refletir, na realidade seria a palavra correta.

Enfim, só o barulhinho do ar condicionado, porta fechada, sem barulho de buzinas, TV, radio, agradeci por não ter que estar em um shopping na praça de alimentação...

A todos os meus clientes indico “a manhã”, podendo ser tarde ou noite do silêncio. Nesse momento você ouve Deus dentro de você, se conhece melhor, tem respostas às mais difíceis questões e aprende a se fazer boa companhia. É um excelente exercício. Eu recomendo!


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